Bactérias marinhas criam rede elétrica cooperativa
RICARDO BONALUME NETO
da Folha de S. Paulo
Imagine duas pessoas que estão a 20 km de distância uma da outra, uma
comendo sem respirar, outra só respirando sem comer --e ambas mantidas
vivas por uma corrente elétrica entre elas.
da Folha de S. Paulo
A comparação dá uma ideia da surpreendente rede elétrica montada por bactérias do fundo do mar, que acaba de ser flagrada pelos cientistas, embora ela tenha apenas 12 milímetros de extensão.
O fenômeno é "verdadeiramente espantoso", disse o pesquisador Kenneth Nealson, da Universidade da Califórnia, em comentário sobre a descoberta na revista "Nature".
Nils Risgaard-Petersen/Divulgação |
20 km
"Para um humano, 12 milímetros não parecem ser uma distância tão grande. Mas, para uma bactéria, isso significa 10 mil vezes o comprimento de suas células, equivalente a 20 km em termos humanos", escreveu.
A comparação com pessoas não é tão maluca assim, pois "comer" e "respirar" são atividades que elas compartilham com bactérias aeróbicas.
Seres vivos obtêm energia a partir de comida, "queimada" com o oxigênio da respiração. Elétrons da comida são transferidos ao oxigênio nesse processo.
A equipe chefiada por Lars Peter Nielsen, da Universidade de Aarhus, na Dinamarca, mostrou que bactérias separadas por longas distâncias transmitem elétrons entre si.
Eles coletaram sedimentos do fundo da baía de Aarhus e fizeram experimentos, quando descobriram a inusitada cooperação entre bactérias na superfície dos sedimentos e outras em camadas mais abaixo.
As bactérias do fundo "comem" substâncias orgânicas e sulfeto de hidrogênio em uma região sem oxigênio, o qual se concentra na água imediatamente acima dos sedimentos.
De algum modo, os elétrons produzidos no fundo sobem para reagir com o oxigênio.
Os experimentos mostraram que, nas amostras sem oxigênio na superfície dos sedimentos, o sulfeto de hidrogênio no fundo era "comido" de modo mais lento, acumulando-se. Quando se voltava a adicionar oxigênio, caíam os níveis do sulfeto.
Paradoxo
"Vimos como processos usando oxigênio eram ligados ou desligados a uma boa distância no fundo do mar quando adicionávamos ou removíamos oxigênio na superfície. Entretanto, nós sabíamos que esse oxigênio nunca chegava ao fundo até as bactérias que o usavam", explica Nielsen.
"Era impossível resolver esse paradoxo até que surgiu a ideia maluca de que o fundo do mar está entrelaçado com fios elétricos naturalmente gerados", completa ele.
Ou seja, todas as bactérias envolvidas obtêm energia, umas só "comendo", outras só "respirando", ligadas por correntes elétricas e criando uma espécie de "biogeobateria".
O próximo passo é descobrir como são feitas as conexões, que podem ser importantes para a formação e a reciclagem dos sedimentos marinhos.
http://www1.folha.uol.com.br/folha/ciencia/ult306u699372.shtml
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