Vítima do carbono
Estudo da UFMG revela que a exposição do alecrim-do-campo a
altas concentrações de gás carbônico na atmosfera provoca alterações
fisiológicas prejudiciais ao desenvolvimento da planta.
Por: Camilla Muniz
Publicado em 12/03/2010
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Atualizado em 12/03/2010
O alecrim-do-campo é
usado no tratamento da esquistossomose e em restaurações ambientais e
sua resina é essencial para a produção da própolis verde (substância
empregada no combate a microrganismos). Foto: Wikimedia Commons.
As consequências do aumento das emissões de carbono na atmosfera
podem ir muito além do aquecimento global e atingir até o
desenvolvimento das plantas. Um estudo feito por pesquisadores da
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) mostra que altas
concentrações de gás carbônico (CO2) no ar provocam
alterações negativas no alecrim-do-campo (Baccharis dracunculifolia)
– planta nativa do Brasil também conhecida como vassourinha.
Os cientistas buscam investigar os efeitos das mudanças na atmosfera
sobre a biodiversidade. Para isso, decidiram verificar inicialmente se o
alecrim-do-campo sofre alterações fisiológicas, químicas e ecológicas
quando exposto a altas concentrações de CO2.
“O aquecimento global suscita debates em todo o mundo, mas raramente
os impactos sobre a biodiversidade são discutidos, principalmente quando
se trata de regiões tropicais”, explica o biólogo Geraldo Wilson
Fernandes, coordenador da pesquisa e do Laboratório de Ecologia Evolutiva
e Biodiversidade da UFMG.
Segundo Fernandes, a escolha do alecrim-do-campo deve-se
principalmente a sua grande importância social: a planta é usada no
tratamento da esquistossomose e em restaurações ambientais e sua resina é
essencial para a produção da própolis verde (substância empregada no
combate a microrganismos). A espécie é encontrada no Brasil (desde a
Bahia até a região sul), na Argentina, no Paraguai e na Bolívia.
Para realizar o estudo, os pesquisadores compararam o comportamento
do alecrim-do-campo quando submetido a ambientes com diferentes
concentrações de gás carbônico. A planta foi cultivada em duas estufas
que simulavam a atmosfera atual da Terra, com 380 partes de CO2
por milhão, e em outras duas que continham 700 partes do gás por
milhão, taxa que deve ser atingida no final do século, de acordo com
estimativas de 2007 feitas pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças
Climáticas (IPCC). Todas as câmaras tinham um sistema computadorizado
de controle de temperatura e umidade
Durante o estudo, o alecrim-do-campo foi cultivado em estufas com
diferentes concentrações de gás carbônico, que simulavam a atmosfera
atual da Terra e a taxa de emissões que deve ser atingida no final do
século, segundo estimativas do IPCC (foto: Camila Sá).
Maiores e menos saudáveis
A pesquisa revelou que, em um ambiente com alta concentração de gás carbônico, o alecrim-do-campo cresce mais rapidamente, o que pode ser explicado pelo mecanismo da fotossíntese: quanto mais CO2 disponível na atmosfera, maior quantidade do gás é capturada para produção de energia. Mas o crescimento acelerado é acompanhado do enrijecimento das folhas, causado pela diminuição dos espaços entre as células e pelo acúmulo de ligninas e celulose.Além disso, os pesquisadores da UFMG identificaram alterações prejudiciais na produção de flavonoides, substâncias que constituem um importante mecanismo de fotoproteção contra raios ultravioleta. “A maior absorção dessa radiação pode afetar o desenvolvimento celular e até provocar a morte de tecidos”, afirma Fernandes.
A próxima etapa do estudo é detalhar os efeitos do gás carbônico sobre taxas de respiração, troca de gases, fotossíntese, produção de substâncias químicas, crescimento de raízes e ainda sobre as relações mutualísticas entre o alecrim-do-campo e fungos endofíticos (organismos que habitam o interior das plantas sem gerar danos). “É importante compreender não apenas as consequências sofridas pelo vegetal, mas os impactos causados a todos os seres vivos que dependem dele”, ressalta o biólogo.
Segundo Fernandes, o homem poderá ser prejudicado à medida que a exposição do alecrim-do-campo a altas concentrações de CO2 altere a composição química e estrutural da planta e inviabilize sua utilização. Caso a tendência de crescimento exagerado se confirme para outras espécies de plantas, os cientistas temem que elas se transformem em pragas invasoras de pastagens e nascentes de água, o que acarretará problemas naturais e econômicos.
Futuramente, a pesquisa deve ser expandida para outros grupos de vegetais, como trepadeiras e gramíneas. Também está sendo estudada a possibilidade de utilizar o alecrim-do-campo como indicador de poluição em ambientes urbanos, por meio da análise, por exemplo, dos efeitos de elementos como arsênio e cádmio sobre a germinação da planta.
Camilla Muniz
Ciência Hoje On-line
http://cienciahoje.uol.com.br/noticias/2010/03/vitima-do-carbono
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